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A NOVA REFORMA TRIBUTÁRIA E SEUS EFEITOS NO MERCADO EDITORIAL BRASILEIRO


Em julho de 2020, o Governo Federal apresentou proposta de reforma tributária que tem por objetivo extinguir as contribuições feitas a PIS e COFINS, unificando-as na Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS). Apesar da nova contribuição fixar alíquota única de 12% e simplificar a base de cálculo, ela retira a isenção que o setor de livros possui, o que deve ocasionar drástica mudança no preço final do produto.


A gravidade do assunto debatido é acentuada quando colocamos em foco o baixo índice de leitura presente na população brasileira.


A pesquisa Retratos da Leitura no Brasil realizada pelo Instituto Pró-Livro em 2016, revelou que o brasileiro médio lê cerca de 2 livros inteiros por ano. Segundo ela, a definição de “leitor” contempla todo aquele que leu ao menos 1 livro nos últimos 3 meses, não importando se inteiro ou em partes[1].


Todavia, quando esse número é comparado com o índice de outros países como França, Estados Unidos e Reino Unido que, segundo o infográfico produzido pelo site Global English Editing, têm média respectiva de 21, 12 e 10 livros lidos por ano[2], se torna nítida a escassez de acesso cultural no país.


Como forma de combater a histórica falta de acesso aos livros, o renomado escritor Jorge Amado, então instituído como deputado constituinte, apresentou proposta de emenda à Constituição Federal de 1946. Por meio dela, ficou garantida a imunidade de imposto aos livros, jornais e periódicos. Sua importância foi tamanha que nossa atual Carta Magna repetiu a imunidade na forma do art. 150, VI, alínea “d”, que veda a instituição de impostos sobre livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão.


Por PIS e COFINS tratarem-se de contribuições, uma espécie de tributo com destinação específica, a lei 10.865/2004 impôs regime especial de alíquota zero sobre vendas e importações desse setor. No entanto, a proposta de reforma tributária retira o livro de suas exceções.


A isenção também repercute nos títulos didáticos: cerca de 48 milhões de crianças e jovens estudam por meio deles. Essa é uma das principais formas de se transmitir educação, conhecimento e cultura a todos os brasileiros independente de classe social, cor e credo. Um meio de criar caminhos alternativos e responsáveis para a mudança e para a democracia.


A elitização do acesso à leitura seria um efeito colateral grave.


Caso a reforma seja aprovada, o Brasil seria um dos únicos países na América Latina a não fazer isenção total para os livros, segundo os dados divulgados pela Associação Internacional de Editores de Livros (IPA em inglês). Junto dele estariam apenas Chile e Guatemala. A entidade se manifestou no começo de setembro pedindo ao Governo Federal que abandone seus planos de taxação sob a alegação de que essa seria uma forma de “minar os programas de alfabetização no país”[3].


Ao ser questionado a respeito do assunto pelo deputado Marcelo Freixo, o Ministro da Economia Paulo Guedes foi categórico: “Vamos dar o livro de graça para o mais pobre, e não isentar o deputado Marcelo Freixo, que pode muito bem pagar um livro. Nós não precisamos de isentá-lo para ele comprar o livro dele. Eu também, quando compro meu livro, preciso pagar meu imposto”[4]. Em uma outra ocasião, ainda versando sobre o mesmo assunto, o Ministro argumentou que o livro é um produto de elite.


Em contrapartida ao falado, a 19ª edição da Bienal do Livro do Rio de Janeiro realizada em 2019 contou com um público de mais de 600 mil pessoas, dentre eles 112 mil estudantes de diferentes classes sociais, muitos dos quais tiveram no festival seu primeiro contato com a literatura.


Outro importante fator a se levar em conta ao analisar a proposta de reforma tributária e de taxação dos livros é o fato do setor ter diminuído drasticamente desde 2018, quando as redes de livrarias Cultura e Saraiva entraram com pedido de recuperação judicial e fecharam inúmeras lojas pelo território nacional.


As notícias mais recentes não são as melhores. Elas revelam que, apesar dos esforços, o setor teve nova diminuição de 48% no faturamento com o começo da pandemia. As livrarias, em especial, tiveram queda de 70% durante os meses em que permaneceram fechadas. Em números, o Sindicato Nacional dos Editores de Livros revela que o valor diminuiu de R$ 125,4 milhões faturados em abril de 2019 para R$ 65,7 milhões em abril de 2020. Por receberem pagamento das lojas físicas e dos marketplaces, a queda também impactou a receita das editoras[5].


O volume de vendas de exemplares físicos também encolheu nos últimos meses. De 2,9 milhões vendidos no ano passado passou a 1,6 milhões neste ano. As pequenas livrarias foram as mais afetadas com a pouca ou nenhuma conversão de suas vendas físicas para online.


Como reação, o setor deu origem a um abaixo assinado virtual em defesa da não tributação do livro que já se encontra com mais de um milhão de assinaturas e algumas outras campanhas virtuais de que se baseiam no mesmo pressuposto.


O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, por meio de sua Comissão de Cultura e Arte, se manifestou sobre o assunto através de uma nota de repúdio à proposta de reforma tributária. “Com esse aumento no tributo, restará inviabilizado o trabalho de muitas editoras, autores, artistas gráficos, ilustradores, livrarias e toda a cadeia produtiva”[6], diz o documento.


Algumas instituições como a Câmara Brasileira do Livro, o Sindicato Nacional dos Editores de Livro e a Associação Brasileira de Editores de Livros Escolares se juntaram para publicar um manifesto em defesa do livro, onde deixam clara a sua posição contrárias à mudança tributária. "As instituições ligadas ao livro estão plenamente conscientes da necessidade da reforma e simplificação tributárias no Brasil. Mas não será com a elevação do preço dos livros – inevitável diante da tributação inexistente até hoje – que se resolverá a questão", diz o texto.




Referências:


[1] LAGO, Davi. Retratos da leitura no Brasil. Disponível em: <https://g1.globo.com/politica/blog/matheus-leitao/post/2019/01/06/retratos-da-leitura-no-brasil.ghtml>. Acesso em: 28 set. 2020.


[2] BROWN, Brenda. The Ultimate Guide to Global Reading Habits (Infographic). Disponível em: <https://geediting.com/world-reading-habits/>. Acesso em: 27 set. 2020.


[3] MOREIRA, Assis. Associação Internacional de Editoras pede que Brasil abandone plano de taxar livros. Disponível em: <https://valor.globo.com/brasil/noticia/2020/09/02/associacao-internacional-de-editoras-pede-que-brasil-abandone-plano-de-taxar-livros.ghtml>. Acesso em 30 set. 2020.


[4] MENDES, Felipe. Tributação sobre livros dificultará acesso à cultura e educação no Brasil. Disponível em: <https://veja.abril.com.br/economia/tributacao-sobre-livros-dificultara-acesso-a-cultura-e-educacao-no-brasil/>. Acesso em: 19 set. 2020.


[5] G1. Mercado de livros tem queda de 48% no faturamento em abril após fechamento de livrarias por causa da pandemia do coronavírus. 2020. Disponível em: <https://g1.globo.com/pop-arte/noticia/2020/05/06/mercado-de-livros-tem-queda-de-48percent-no-faturamento-em-abril-apos-fechamento-de-livrarias-por-causa-da-pandemia-do-coronavirus.ghtml>. Acesso em: 26 set. 2020.


[6] PUBLISHNEWS, Redação. OAB e UBE lançam manifestos contrários à tributação do livro. Disponível em: <https://www.publishnews.com.br/materias/2020/08/14/oab-e-ube-lancam-manifestos-contrarios-a-tributacao-do-livro>. Acesso em: 30 set. 2020.

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