VALORES DE TERCEIROS EM POSSE DE EMPRESA EM RECUPERAÇÃO NÃO SE SUBMETEM AOS EFEITOS DO PROCESSO
O Recurso Especial nº 1.736.887[1] de relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva os valores pertencentes a terceiros que estejam, em decorrência de contrato, na posse de sociedade em recuperação judicial devem ser excluídos dos efeitos do processo de soerguimento.[2]
No caso, as recorrentes contrataram a empresa recorrida para prestar serviços de administração financeira, na qual a empresa contratada forneceu cartões de crédito a seus clientes.
No momento da compra de mercadorias com os cartões, os valores ficavam na posse da recorrida, que descontava o valor pela prestação do serviço e repassava o restante às recorrentes.
Neste ponto, destaca-se a declaração das Recorrentes de que “o repasse consistia em mera transferência da posse do dinheiro que nunca deixou de ser propriedade das Recorrentes”.
Portanto, afirmaram que os valores retidos pela recorrida lhes pertenciam, pois apesar de o contrato firmado não estar expressamente previsto no artigo 49, § 3º, da LRF, possui a mesma natureza jurídica dos citados naquele rol, devendo ser dada interpretação ampliativa ao dispositivo legal em comento, como já fez a Corte ao equiparar a cessão fiduciária de crédito à alienação fiduciária.
Defenderam, ainda, que se o credor que tem a propriedade resolúvel está excluído da recuperação judicial, com mais razão aquele que tem a propriedade plena.
A Terceira Turma afirma que “de acordo com o disposto no artigo 49, caput, da Lei nº 11.101/2005, estão sujeitos aos efeitos da recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido”.
Porém, os recorrentes não detêm propriamente um crédito perante a recorrida. Na realidade, a recuperanda está na posse de valores que pertencem aos recorrentes em decorrência do descumprimento do contrato de prestação de serviços firmado entre as partes, que previa o repasse dessas quantias”.
Ainda, para elucidar mais o direito da Recorrente, o acórdão afirma que “A questão mais se assemelha a uma hipótese de restituição, prevista no artigo 85 da Lei nº 11.101/2005, em que o proprietário de bem que se encontra em poder do devedor na data da falência pode pedir a sua restituição”.
Ademais, o acórdão afirma que a questão é útil para demonstrar que na hipótese de a devedora se encontrar na posse de bens de terceiros, esses não são considerados seus credores, não se podendo falar em habilitação, mas no exercício do direito de sequela.
Portanto, se as Recorrentes não detinham propriamente um crédito em face da Recorrida, não podem se submeter aos efeitos da recuperação judicial nos termos do artigo 49, caput, da Lei nº 11.101/2005.
A decisão também acatou as alegações das Recorrentes de que a lei de 11.101/2005 prevê que os titulares de propriedade resolúvel não se submetem aos efeitos da recuperação judicial, com muito mais razão quanto à propriedade plena.
Por fim, o acórdão destacou que “dentre os meios de recuperação judicial previstos no artigo 50 da LRF, não está incluída a utilização de valores que integram o patrimônio de terceiros”.
[1] Disponível em https://processo.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=2040238&num_registro=201800664111&data=20210416&peticao_numero=-1&formato=PDF
[2] Disponível em https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/22062021-Valores-de-terceiros-em-posse-de-empresa-em-recuperacao-nao-se-submetem-aos-efeitos-do-processo.aspx;
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