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STJ DECIDE SOBRE A POSSIBILIDADE DOS BANCOS CANCELAREM CONTAS DE CORRETORAS DE CRIPTOMOEDAS.

Pela primeira vez na história do judiciário brasileiro o tema das criptomoedas foi debatido no cenário das instâncias superiores. O debate envolveu o ato das instituições financeiras em cancelar, de forma unilateral, as contas das corretoras de criptomoedas [1].


A exploração do segmento de moedas digitais através das corretoras especializadas, tem como principal objetivo intermediar comercialização das moedas virtuais e o fornecimento de informações do mercado financeiro e dos investimentos relacionados. Este mercado, ainda pendente de regulamentação, envolve alguns riscos às instituições financeiras que sediam as contas das operadoras. Dentre as principais preocupações está a Lei de Lavagem de Dinheiro que permite a punição dos diretores dos bancos com inabilitação por até 10 anos, em caso de descumprimento da normativa.


Nesse sentido, conforme divulgado no Portal Bitcoin, as corretoras receberam das instituições financeiras, como Itaú, Bradesco, Sicredi e Banco do Brasil, o comunicado do encerramento das suas contas correntes. A notícia levou vários corretores a buscar a tutela jurisdicional, a fim de manter a conta corrente ativa [2].


O STJ, no acórdão do Recurso Especial nº 1696214/SP, entendeu ser correto o posicionamento das instituições financeiras, de que o cancelamento das contas dos corretores de criptomoedas deve ser pautado na ótica do Código Civil, afastando-se para tanto o Código de Defesa do Consumidor (CDC) [3].


O primeiro fundamento mencionado foi no sentido de afastar a aplicabilidade do Código do Consumidor. Revestido no artigo 2º do CDC que, segundo José Geraldo Brito, define os requisitos para ser considerado consumidor, entendeu-se necessária a presença de todos os requisitos do artigo para que fosse adotado este ordenamento, além da observância da teoria finalística ao caso concreto (destinatário fático e econômico do bem ou serviço) [4].

Ademais, o STJ entendeu que a proteção assegurada pelo CDC não se resulta ao consumo intermediário, devido ao fato do produto não alcançar imediatamente o consumidor final, mas sim passando por uma nova cadeia de produção com o intuito de criar um novo bem ou serviço.


O ponto principal do julgado consiste no entendimento de que a abertura de contas pelos correntistas de criptomoedas foi definida como um como mecanismo de “efetivação do seu serviço”. Desta forma, torna-se um insumo para a realização do seu serviço.


Cumpre reparar a relevância do conceito sobre a atividade de corretor de criptomoedas apresentados pelos ministros, uma vez que tal definição é pilar para o afastamento das normas consumeristas. Assim, sua definida compõe-se como empresas que exploraram atividade de corretagem ou intermediação de moedas virtuais ou criptomoedas.


O acordão que aponta a Resolução do Bacen, nº. 2.025/1993, a qual autoriza a rescisão unilateral, reforça tal posicionamento, todavia, é necessário cumprir os requisitos do contrato, além de notificar o correntista sobre o cancelamento. Esta possibilidade ocorre em virtude da conta corrente bancária enquadrar-se em uma relação dinâmica e durável, de execução continuada e intuito personae.


Outro fundamento apresentado foi o da Súmula 297 do STJ, que disciplina a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor para as instituições financeiras. Contudo, conforme decisão, há a necessidade de existência de cláusulas abusivas, ilegalidade que comprovam a ausência de equilíbrio. Com isso, ao se observar o caso em questão, entendeu-se ausente o referido desequilíbrio.


Ao afastar os princípios consumeristas, a aplicação do Código Civil é iminente. Ademais, observando o artigo 187 do CC, o relator destrinchou, sob ponto de vista isolado, a tipificação do abuso de direito, observando dois pontos: 1) de que “há a possibilidade jurídica de resilição do contrato de conta corrente”; e 2) de que há necessidade de a conta corrente estar relacionada a “infraestrutura essencial para existência econômica da recorrente”, entendendo pela existência de extrapolação dos limites pela instituição bancária.


Não obstante, este ponto não floresceu, em virtude da divergência dos outros ministros que deram voto contrário, sob a justificativa de que em outros casos semelhantes o respaldo legal foi nos artigos 4ª e 9ª da Lei 4.595/64, que preveem a competência para o Conselho Monetário Nacional e ao Banco Central do Brasil na “aplicação das penas” e para “cumprir e fazer cumprir as disposições” respectivamente.


Ambos organismos editaram a Resolução nº 2.747/2000 [5] que regula a rescisão do contrato de conta de depósito à vista, nos termos do artigo 12, inciso I e II, no qual se exige a “comunicação prévia” e “prazo para adoção das providências relacionadas à rescisão do contrato”. Contudo a essência no entendimento dos ministros esta na inexistência de abuso, tipificada no inciso V, na qual o mero aviso da instituição ao correntista com a data do efetivo encerramento da conta é mais que o suficiente para o cancelamento da conta.


Apesar disso, o voto do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, entendeu também pela aplicação do princípio da liberdade de contratação, de modo que ninguém está obrigado a vincular contratos com particulares contra a sua vontade, com fundamento no artigo 421 do Código Civil.


Pelo exposto, pode-se concluir que dois pontos foram essenciais para sustentação na decisão dos ministros: a primeira está ligada a qual legislação deve ser aplicada para o conflito em questão e a outra, na definição da atividade correntista de criptomoedas, na qual a abertura de conta-corrente seria considerada insumo para o seu serviço.


Esgotado os debates, o entendimento da Corte Superior sobre este tema, foi contrária aos corretores de moedas criptomoedas, mesmo com a existência da Súmula 297 do STJ, ao fazer prosperar as dizeres dos direitos civilistas e do princípio da liberdade de contratação à revés dos direitos consumeristas.


REFERÊNCIAS

[1] FOLHA DE SÃO PAULO. BANCOS PODEM FECHAR CONTAS DE CORRETORAS DE CRIPTOMOEDAS, DECIDE STJ, 09/10/2018. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2018/10/bancos-podem-fechar-contas-de-corretoras-de-criptomoedas-decide-stj.shtml>. Acesso em 18/10/2018. Acesso em 18/10/2018

[2] ANTUNES, Alexandre, Porta do Bitcoin, 15/08/2018. Disponível em: <https://portaldobitcoin.com/banco-do-brasil-itau-e-outros-dizem-motivo-de-fechar-contas-de-exchanges-de-criptomoedas-e-associacao-conta-ataca/>. Acesso em 18/10/2018.

[3] STJ, REsp nº 1696214/SP, 16/10/2018, <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1735391&num_registro=201702244334&data=20181016&formato=PDF>. Acesso em 01/11/2018

[4] FILOMENO, José Geraldo Brito. MANUAL DE DIREITOS DO CONSUMIDOR. São Paulo: Atlas, 14ª ed., 2016, p. 20.

[5] MENDES, Aldo Luiz. BANCO CENTRAL DO BRASIL, Comunicado nº 25.306 de Novembro de 2014, 09/02/2014. Disponível em: <https://www3.bcb.gov.br/normativo/detalharNormativo.do?method=detalharNormativo&N=114009277>. Acesso em 18/10/2018

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