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DESCONTO DE IPTU PARA IMÓVEIS EM RUAS DE FEIRAS LIVRES


A feira é uma das mais antigas e resistentes modalidades de comércio varejista. Apesar de incertos o local e a época de origem do costume, historiadores afirmam a presença desse evento desde 500 a.C. em antigas civilizações como a fenícia, a romana e a árabe[1]. Certo é que instituto possui grande importância, trazendo diversidade de produtos ofertados com preços que atendem a população local e promovendo o resgate da cultura popular, favorecendo o encontro de pessoas.


Entretanto, aqueles que moram nas proximidades não têm somente bons aspectos a relatar, posto que alguns fatores são negativamente influenciados pela presença de uma feira-livre na região. As barracas podem bloquear garagens e obstruir vias, forçando motoristas a trafegar em rotas alternativas e tornando o trânsito um problema nas redondezas; a poluição sonora, por sua vez, não se limita aos períodos matutino e vespertino, pois é durante a madrugada que os feirantes realizam a montagem da estrutura do mercado. A falta de banheiros públicos e estacionamentos também é alvo de críticas, e os resíduos sólidos resultantes do evento, como caixas, restos de comida e lixo podem ser notados semanalmente ao final do evento.


Pesquisas no mercado imobiliário revelam que o imóvel localizado nas imediações de uma feira pode, inclusive, ter uma desvalorização de até 20%, gerando desinteresse por parte de possíveis compradores. Outros exemplos de “vizinhos indesejados” são escolas, bares, pontos de ônibus e postos de gasolina com lojas de conveniência.


Diante deste inconveniente, alguns municípios criaram locais públicos adequados, de modo a facilitar o acesso às feiras, otimizar o fluxo de pessoas e diminuir os impactos negativos causados à vizinhança; em outros, são formuladas maneiras de compensar os moradores que sofrem diretamente com os transtornos existentes.


Aqui na região da Baixada Santista, a cidade de São Vicente se utiliza dos tradicionais moldes de feira-livre[2]. Praia Grande por sua vez, tem nos últimos anos apostado na primeira opção, instalando em alguns bairros as chamadas “feiras confinadas”, organizadas em espaços de múltiplo uso e organizados dias, horas e locais para a realização das feiras (disponíveis no site da Prefeitura). A segurança é garantida por guardas municipais e monitoramento de câmeras; há estacionamento, inclusive para os caminhões dos feirantes, sanitários disponíveis e as barracas são organizadas por setores[3].


No município de Guarujá, optou-se pela via da compensação através da edição do Decreto 12.743/2018, que regulamenta a Lei Complementar Municipal nº 182 de 22 de maio de 2015. Essa lei altera o Código Tributário Municipal, inserindo o artigo 209-A, que trata da concessão de desconto de 50% (cinquenta por cento) no Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) aos proprietários de imóveis localizados em ruas em que são realizadas feiras-livres, nos seguintes termos:


"Art. 209-A Fica concedido o desconto de 50% (cinquenta por cento) no IPTU - Imposto Predial e Territorial Urbano, aos contribuintes cujos imóveis estão localizados em ruas ou avenidas onde são realizadas feiras livres."


Trata-se de norma de isenção tributária, de caráter geral. O Decreto traz um conjunto de informações que devem ser apresentadas pelo contribuinte no momento de pleitear pelo benefício fiscal. É imprescindível que o imóvel seja localizado em área de feira e que nele a pessoa resida, além de necessária a adimplência com o Município de Guarujá até a data do pedido, que deve, de acordo com o art.197 da Lei Complementar n.º 038/97, ser apresentado até o último dia do mês de novembro sob pena da perda do benefício no ano seguinte.


Os demais documentos que devem ser apresentados junto à solicitação de desconto estão disponíveis em: guaruja.sp.gov.br/isencao-de-iptu/.


A medida é resultado de uma longa disputa judicial entre a Câmara Municipal e a Prefeitura. O Legislativo já havia aprovado a concessão do benefício em 2012, mas o Executivo vinha tentando obter a anulação na Justiça.


Durante dois anos, a matéria foi objeto de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade movida pela Prefeitura de Guarujá no Tribunal de Justiça de São Paulo e no Supremo Tribunal Federal. A Prefeitura sustentou a tese de que a lei geraria novas despesas ao erário público e, por isso, seria matéria de competência exclusiva do Executivo, eivada, portanto, de vício de inconstitucionalidade.


A tese não prosperou em nenhum nos dois órgãos julgadores, que acolheram a defesa promovida pelo diretor jurídico do Legislativo Municipal no sentido de que a medida atende ao princípio constitucional da isonomia.


Entre os precedentes do STF, merece destaque o voto do ministro Celso de Mello no RTJ 133/1044, in verbis: "Não mais assiste ao Chefe do Poder Executivo a prerrogativa constitucional de fazer instaurar, com exclusividade, em matéria tributária, o concernente processo legislativo."


A lei atualmente beneficia proprietários de 17 ruas do município[4].


Na cidade de Santos, um Projeto de Lei Complementar que previa a diminuição de 25% do imposto foi aprovado pela Câmara Municipal em segunda discussão (17 votos a 2) em abril de 2016[5].


De acordo com a Secretaria de Finanças de Santos, à época, a medida favoreceria mais de 12 mil moradores e não causaria grande prejuízo ao orçamento da cidade. O benefício não seria cumulativo com outros descontos ou isenções já concedidas e seria cancelado em caso de eventual mudança de local das barracas.


Entretanto, em junho do mesmo ano, o chefe do Executivo vetou a proposta e a Câmara acompanhou a decisão. Um dos fundamentos do veto foi o fato de que o projeto versava sobre isenção fiscal em ano de eleições, indo de encontro ao disposto pela lei 9.504/97 (Lei das Eleições), que proíbe que a Administração Pública realize a concessão de benefícios em período eleitoral.


Além disso, também foi citada a Lei de Responsabilidade Fiscal. Segundo o Prefeito, o projeto não observava nenhuma exigência da Lei, especialmente no que tange às medidas compensatórias de renúncia de receita, e não foi apresentado estudo de impacto financeiro junto ao projeto.


Em suma, de acordo com aqueles que se posicionaram pela manutenção do veto, a medida representaria grave risco de comprometimento das finanças públicas de Santos. Embora a proposta de desconto já tenha sido assunto levantado na Câmara Legislativa de Santos em outras legislaturas, restou infrutífera por motivos de ordem financeira e política.


Nada impede, todavia, que o projeto seja retomado em uma próxima oportunidade, sendo adotadas as devidas cautelas e realizados estudos de viabilidade para que se possa compensar os santistas residentes em ruas e avenidas onde acontecem as feiras-livres, observando o princípio constitucional da isonomia. Além disso, também é possível pedir apreciação judicial, caso a caso, com base nos precedentes supra, já que existem desde incômodos de locomoção até a depreciação no valor dos imóveis por conta desses eventos.





[1] TODA MATÉRIA. História e origem das feiras. Disponível em: https://www.todamateria.com.br/historia-e-origem-das-feiras/. Acesso em: 11.set.2019.



[2] PREFEITURA DE SÃO VICENTE. Feiras livres. Disponível em: http://www.saovicente.sp.gov.br/publico/noticia.php?codigo=202. Acesso em: 11.set.2019.



[3] PREFEITURA DE PRAIA GRANDE. Feira livre se transforma em centro de compras. Disponível em: http://praiagrande.sp.gov.br/pgnoticias/noticias/noticia_01.asp?cod=5145. Acesso em: 11.set.2019.


[4] CÂMARA MUNICIPAL DE GUARUJÁ. Isenção de IPTU a imóveis onde há feiras livres entra em vigor. Disponível em: http://www.camaraguaruja.sp.gov.br/Noticia/Visualizar/752. Acesso em: 12.set.2019.


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